No imaginário popular brasileiro,
costuma-se avaliar que a sucessão de fatos imponderáveis ou situações
negativas, convergem para a não concretização de metas e sonhos - em regra,
quando tudo dá errado, surge a seguinte justificativa: "não era para acontecer".
E nas terras de Nelson Mandela, esta
máxima também é válida?
"It always seems impossible until it's
done."
Nelson Mandela
Aqui surge a fundamentação desta
resenha, construída pelo amigo Marcelo Alves, que nos impulsiona a acreditar
que não, que a frase acima, além de perpetuar-se ao longo do tempo, possui
abissal profundidade: "tudo parece
impossível até que seja feito".
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No último domingo, 29 de maio de
2016, 85 (oitenta e cinco) brasileiros(as) concluíram a tão sonhada e desejada Rainha
das Ultras e no meio desses abnegados corredores, meu nome - Marcelo Alves - estava lá.
Quer saber como isto aconteceu? -
então acompanhe!!!
Em 2005, em uma das minhas primeiras
participações em corrida de rua, recebi dentro do kit de corrida, uma revista que
detalhava a participação de brasileiros(as) na Comrades Marathon.
Aquela leitura foi instigante a
ponto de não mais esquecer seus detalhes: ultra maratona com 89 km, realizada
no meio do ano na África do Sul, entre as cidades de Pietermaritzburg e Durbam,
alternando-se os locais de largada e chegada, ampla participação popular.
O tempo passou é há pouco mais de
um ano, em tom de brincadeira, postei no WhatsApp, que iria participar da
Comrades em 2016. Ocorre que aquele grupo era (e ainda é) constituído
exclusivamente por amigos que correm e pedalam, dentre os quais, estava Dionísio Silvestre, que costuma redigir
e publicar resenhas sobre experiências de corridas (dele e dos amigos) no Blog "Correr é Pura Paixão".
O fato é que o amigo levou o
assunto a sério e decidiu publicar tal insanidade, de tal sorte que me vi imediatamente
obrigado a enfrentar o desafio. Sem muita demora recorri ao mesmo amigo, para as
orientações na preparação, uma vez considerado sua formação acadêmica e a
experiência adquirida nas suas participações na Comrades Marathon.
Na estratégia inicial, o primeiro
obstáculo: - obter o índice mínimo para participar da prova, qual seja: completar
os 42 km da maratona abaixo de 5 horas. Neste aspecto, escolhi a maratona de
Curitiba, que possui excelente altimetria. No dia da corrida, embora tenha
sofrido dores intensas nas costas, completei a maratona e obtive o
"qualifying".
Dali em diante, no decorrer do extenuante
treinamento, surgiram muitas incertezas, dores quase insuperáveis, cansaço físico
e mental; obviamente, a sensação do insucesso me assombrava. Confesso que
a vontade de abrir mão da prova me passou pela cabeça.
Os treinos seguiam fortes e as
distâncias foram sendo superadas: 32 km - 40 km - 50 km.
Foi quando me dei
conta que o corpo estava sólido e pronto para o bom combate.
Os dias do mês de maio passaram-se
numa velocidade supersônica. Em uma quarta-feira, 25 de maio de 2016, embarquei
para a África do Sul, juntamente com outros amigos de Brasília: Bonfim, Sérgio,
Margareth e Silvestre.
Na Expo Bonitas Comrades, ao respirar
a atmosfera da prova, começo a perceber que o engajamento da população é extraordinário
e que a quantidade de estrangeiros é significativa.
Embora tenha tentado manter
postura tranquila, tudo era novidade. A ansiedade e o nervosismo insistiam em
bater à porta. Nos três dias que antecederam a corrida, encontro com inúmeros brasileiros
e neste momento, ouço suas histórias de como ali chegaram.
Na véspera da prova, para fazer
frente à ansiedade, faço um trote com o amigo Silvestre, conversamos sobre alguns
pontos essenciais para o sucesso da missão: ritmo, frequência cardíaca,
hidratação e suplementação.
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...aquecendo as turbinas em Durbam - 28.05.2016 |
Nos dispersamos antes da
largada, uma vez que cada um segue para o seu portão (C, D, E e F), naquele
instante, fico sozinho, absorto e envolto em lembranças, pensamentos, alegria e
ansiedade. Faço uma prece agradecendo a Deus por ali estar, agradeço aos amigos
e especialmente minha querida esposa Viviane,
que nos momentos bons e ruins, esteve sempre ao meu lado.
Durante o cerimonial que antecede
a largada é tocado o hino da África do Sul e a seguir todos os participantes
cantam a música "Shosholoza". Neste instante, não consigo conter as
lágrimas, que rolam em meu rosto sem o menor pudor.
Surpreso, quando olho para os
lados, percebo que não sou o único e que outras pessoas - homens e mulheres - também
choram. A seguir, o canto do galo e o tiro de canhão determinando o início da 91ª Comrades Marathon.
Sem sombra de dúvidas, começava a
corrida mais importante da minha vida, na minha mente só havia uma imagem: a linha
de chegada em Durbam. No decorrer daquela longa jornada, busquei manter ritmo
confortável, hidratando-me constantemente.
Ao longo do trajeto, a população permaneceu
incentivando e apoiando os atletas, levaram comidas e bebidas, sempre com muita alegria. Aquelas cenas me impressionaram e não me saem da memória, tamanha a
participação da população.
Quanto à minha corrida, seguia
dentro da meta imaginada: corria quando podia e nas subidas, que eram muitas,
alternava trote e caminhada. Em razão do esforço sobre humano, parei para
receber massagens na musculatura das pernas.
No que tange à camaradagem entre
os corredores, por vezes, ao caminhar, era indagado pelos participantes se tudo
estava bem, em resumo, não havia uma competição e sim, camaradas correndo lado
a lado, literalmente.
Faltando 8 km para o término da
corrida, já não conseguia conter a alegria, entretanto, sabia que em provas
longas o imponderável pode acontecer.
Firme no meu objetivo, continuava
sem olhar para trás. Naquele momento, absolutamente nada me permitia dar um
passo atrás.
Ao chegar nas imediações do Sahara Stadium Kingsmead, o sorriso era
visível em meu rosto, entro no estádio, lotado, todos comemorando a chegada dos
corredores, cruzo o tapete da linha de chegada, ajoelho, levanto os braços para o céu e agradeço a Deus, por ter me permitido concluir a Comrades, não consigo
chorar, mas estou em êxtase, confiro meu tempo: 10 horas e 58 minutos.
Coloco a medalha no peito, fico
contemplando-a por alguns instantes, sigo ao encontro dos amigos e o primeiro a
me encontrar é o amigo Silvestre, imediatamente, rendo minhas homenagens ao
mentor que, com extrema sabedoria e paciência, me conduziu no decorrer daquele
ano de treinamento.
Se retornarei ano que vem para o back to back? - o futuro dirá!!!
Forte abraço!!!
Marcelo Alves