quarta-feira, 17 de julho de 2013

Comrades 2013 - Relato de Magda Andrade & Josue Netto

"Esse espaço nasceu inspirado na vontade de compartilhar (...) as lições recebidas dos abnegados corredores de rua de nosso país".

Pois bem amigos, hoje, eu trago um texto simplesmente fantástico, assinado por Josue Netto e publicado no dia 24.06.2013, no blog "Pulso - O mundo da corrida passa por aqui"

Trata-se de uma verdadeira pérola. É óbvio que eu não poderia deixar passar em branco a oportunidade de reproduzir o texto aqui no blog "Correr é pura paixão". 

O relato é de uma riqueza de detalhes impar. Vale a pena conferir e conferir quantas vezes forem necessárias. 

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Comrades 2013 - Relato de Magda Andrade e Josue Netto
extraído do Blog: "Pulso - O mundo da corrida passa por aqui." 24.06.2013
"Enchendo linguiça...
Como a Tia Magda exigiu uma redação de oito páginas, resolvi incluir esta parte para, literalmente, “encher linguiça” e não tirar nota zero. Portanto, se alguém quiser pular esta parte não terá perdido nada. Aliás, se quiser pular também as outras partes, mal nenhum fará (neste caso, vá direto para o final que tem a letra de uma música bonita do Raul Seixas). Relatos sobre correr e viver geralmente são desinteressantes para quem lê; melhor mesmo é correr e viver!

Diz a sabedoria popular que toda história tem um começo e um fim. Ou, numa expressão mais divertida, alguma coisa só termina quando acaba. Podemos até comparar uma corrida com uma história, a começar quando pisamos no primeiro tapete de cronometragem e com fim na linha de chegada.

Mas eu, particularmente, creio que certas corridas, sejam de cinco ou de mil quilômetros, podem ser entendidas como histórias sem fim, tal a importância em nossas vidas. Difícil determinar quando tudo começou e, mesmo após pisar no tapete da chegada, fica uma sensação que ainda não acabou, que foi dada apenas uma pausa para respirar e que a história continua.


A Comrades (prefiro pronunciar “comreides” só para não matar uma piada criada pelo nosso amigo PH; horrível piada, diga-se, mas tenho que admitir que pouquíssimas pessoas tem a capacidade de criar uma) é uma dessas corridas que não tem início nem fim, que continuam mesmo quando acabam.


É uma prova também, canso de dizer, que parece ter alma, feito uma pessoa. Não sei se o meu sentimento é compartilhado por outros camaradas, mas não é simplesmente um percurso de 87 ou 89 quilômetros onde batemos o pé no asfalto por longas horas. Para mim, é como uma viagem não só de um ponto a outro, mas também por uma história iniciada há mais de noventa anos, uma oportunidade de viajar dentro de si próprio, de se descobrir, de tentar se conhecer melhor, mesmo para mim que tenho dificuldade de me entender.


Falo de Comrades respeitosamente, como se falasse de uma pessoa; de suas ladeiras e pontos de referências (Cowies Hill, Inchanga, Polly Shortts, Wall of Honour, Arthur’s Seat etc.), como portais mágicos aonde você vai superando seu cansaço e limitações.



Acho que Começou Assim

Mas, como pior do que uma história mal contada é uma história mal contada sem início nem fim, vou tentar situar como tudo começou para nós.


Ouvi falar em Comrades pela primeira vez em 23/08/09, durante a Super Maratona de Friburgo. Eu e Conrado fizemos apenas a meia maratona, enquanto os lendários “pangas” Claudinha, Magda e André correram a incrível distância de 50 quilômetros. Ainda lembro a Claudinha gritando feito uma louca que “existe corrida depois dos 42” quando passou pela marca da maratona. E também da Magda, na chegada, a dizer para alguém que tinha sido um excelente treino para a Comrades.


“Comrades? What porra is it?”, devo ter perguntado. E naquele momento, após as explicações, tornei-me tão insano quanto aqueles três ultramaratonistas, interessado em fazer aquela prova tão difícil. Estranhamente, lembrei também que um dia, acho que ainda adolescente, vira numa dessas sessões-da-tarde um filme sobre a Comrades.


Nossa primeira Comrades aconteceu em 29/05/2011, percurso de subida, com a participação de Claudinha, Aline, Bigatello e Pedro Henrique, além de mim, com o precioso suporte do professor Alexandre e de Marcus, o santo marido da Claudinha. Infelizmente, Magda não pode ir nesse ano. Nem terminada a prova e já sabíamos que iríamos retornar para o back-to-back.


E realmente voltamos eufóricos para nossa segunda prova, percurso de descida, em 03/06/2012. Aline, devido ao seu primeiro Iron na mesma época, não pode ir, mas o grupo ganhou a presença do professor Ricardo, Magda, Pedro Palmeira e Marcos Salomão, ainda com o suporte do professor Alexandre, da Louise e Isabela.


Na época das inscrições para 2012, centenas de emails devem ter sido trocados, um incentivando o outro. Lembro um email da Claudinha que simplesmente dizia “já fiz a minha inscrição, agora quero ver quem é macho e vai fazer também!”. Delicada a nossa eterna musa da Comrades!


Para 2013, devido a motivos diversos, tudo indicava que o grupo ficaria restrito a mim, Magda e Bigatello.




Os Treinos para 2013


Como sempre, iniciamos os treinos em janeiro, após um breve descanso da Ultra BR 135, 217 km que fizemos em trio (eu, Magda e Bigatello, com apoio e bulliyng do professor Flávio Doce e da Adriane, amiga da Magda).


Nossa intenção era treinarmos juntos para fazermos a prova também juntos. Infelizmente, Bigatello, com diversas lesões, não pode acompanhar estes treinos. Fui obrigado, então, a treinar sozinho com a Magda. Já são mais de 500 km a correr com esta criatura e não sei se sofrimento maior foi para os pés ou para os ouvidos. Dizia que treinar com ela era uma forma de acumular milhas para entrar no céu; como em determinados casos ganhamos milhas em dobro, já tenho o suficiente para ir para o céu três ou quatro vezes.
O Bigatello sofreu tanto com lesões que já perguntávamos onde não doía, e a resposta era simplesmente: “o cabelo”. Ele ainda fez a Ultra do Rio Grande, 50 km, para variar sem o conhecimento do treinador, comigo entrando de gaiato, para saber se teria condições de correr a Comrades, mas infelizmente não foi possível.

Sou testemunha de quão puxados foram esses treinos para a Magda, que precisou de muita garra e determinação para superar diversas dificuldades, inclusive lesões.


Lembro-me de treinos em que ela já iniciava super cansada, caminhando, e ia pouco em pouco se superando até cumprir distâncias de 30, 40, 50 km.


No dia 12/05 fizemos o nosso último longo de 60 km e algo muito marcante aconteceu. Já tínhamos corrido cerca de 40 km, saindo do Alto até a Lagoa, voltando ao Alto, descendo para a Usina. Quando subíamos da Usina para o Alto, ritmo ainda confortável, repentinamente Magda foi tomada de uma estranha aflição e começou a chorar, mesmo sem nenhuma dor ou desconforto. Concluímos o treino e ao chegar em casa ela recebeu a notícia que seu pai fora internado horas antes após um enfarto. Nossa impressão é que durante o treino ela, de alguma forma, soube do que acontecera.


Enfim, terminávamos nossa preparação para a Comrades, mas a Magda não tinha certeza ainda se poderia viajar ou não.


 A Viagem


Infelizmente, o pai da Magda veio a falecer no dia 22/05 e ela, após tomar todas as providências que precisava, decidiu por viajar.


Partimos no dia 29/05, por volta das 11 horas. Viagem cansativa, Rio – São Paulo – Johanesburgo – Durban. No Galeão, a presença do Bigatello, junto com a Denise, a nos incentivar e encomendar coisas do free-shopping, inclusive um imprescindível aparador de pelos nasais (a conhecida e incurável compulsão de comprar). Em Garulhos, Pedro Henrique a nos dar semelhante força, mas sem a listinha de compra.


Conversas triviais com corredores de todo o Brasil, cada um com suas experiências, temores e expectativas. Magda a revelar um desconhecido lado tiete, quase a desmaiar de emoção, pedindo freneticamente o autógrafo de um corredor de elite; disse ela que era para a Claudinha, mas tenho dúvidas. Fiquei decepcionado, é claro, pois há muito tempo corro com ela e nunca me pediu um autógrafo.


Voo partindo com duas horas de atraso, muita turbulência. Segundo Magda, parecia que o avião iria cair. Até me pediu papel e caneta para escrever um bilhete-testamento para a mãe e para o filho e custou a entender que dificilmente o mesmo seria encontrado junto com a caixa-preta do avião, que na verdade é laranja como a Equipe FDV (Filhos do Vento). Mas chegamos bem, no horário previsto, na quinta-feira, por volta das 14 horas, praticamente 24 horas de viagem, inclusive as esperas em aeroportos.


Em Durban


Ficamos num hotel simples, mas com excelente localização, em frente à praia, permitindo ir a pé para a feira da corrida, largada, restaurantes. Ao contrário dos anos anteriores, optamos por não alugar carro, mas fizemos praticamente tudo o que pretendíamos.


Até que tentei ser nosso guia, mas quando íamos à feira da corrida, após muito tempo a caminhar, vimos uma placa informando “Pietermaritzburg a 10 km”. Desconfiado que estivesse um pouco perdido, deleguei esta função à Dona Magda e ela até que se virou direitinho. Menos mal que em pouco tempo eu já conseguia ir da recepção ao quarto do hotel sem me perder.


Na própria quinta-feira fomos retirar o kit e conhecer a feira da corrida, como sempre bem variada e organizada e com um atendimento preferencial para os estrangeiros.


Interessante que no kit da Magda veio um OB como brinde; fui logo ver o meu kit, ansioso, pois, tal como o sutiã, o primeiro OB deve também ser inesquecível. Mas para os meninos o brinde era um desodorante. Apenas uma indicação de quão profissional é a organização da prova.


Alguma dificuldade para comer, pois alguns restaurantes parecem seguir a estranha regra de fechar para almoço e jantar.


Às vezes também foi desagradável caminhar pela orla de Durban. Mais de uma vez fomos assediados insistentemente por pessoas adultas pedindo dinheiro. Magda, inclusive, teve que ouvir a versão em inglês do nosso já conhecido “vocês gostam mesmo é de ser roubados...”.


Na sexta-feira de manhã fizemos nosso último treino de 8 km em ritmo bem moderado, só para tirar o cansaço da viagem.


No sábado, fomos rapidamente à praia, pois Magda queria experimentar as águas do “Oceano Pacífico”. A princípio achei que estava brincando, mas quando ela repetiu “Oceano Pacífico” pela quinta vez, percebi que geografia nunca deve ter sido o seu forte no primário. Ela achou quente a água, eu que era gelada, mas mesmo assim tornei-me “Iemanjá bi-oceânico”.


Ela aproveitou o banho de mar para jogar parte das cinzas de seu pai no Oceano Índico, uma linda e emocionante homenagem.


Em seguida fomos visitar o estádio da Copa, passeio quase obrigatório, e almoçamos uma comida inédita: massa.


No jantar, para ser diferente, novamente massa. Comentário comum a todos de nunca mais comer massa na vida. Encontro agradável com corredores do Rio: Nadjala, Rodrigo, Valdir. Ilson e Froes (da Speed) e Álvaro (Chão do Aterro).


Última noite de quase sono antes da prova, ansiedade grande, pesadelo de todo corredor de perder a hora da largada, de esquecer o chip ou o tênis.



A Corrida

Acordamos às duas da manhã. Café no hotel às três. Partimos a pé para a largada, que seria às 05h30min, bem pertinho do hotel.

O ritual emocionante de sempre. Toca-se o Hino Nacional da África do Sul, a tradicional Shosholoza, que faz arrepiar, outra música que pouca gente conhece (Carruagem de Fogo). O tradicional canto do galo, o tiro de canhão e finalmente a largada. Demoramos cerca de sete minutos até passar pelo tapete.

A todo o momento a visão do mar de corredores a nossa frente; nos lugares mais estreitos o som cadenciado de centenas de pés tocando o asfalto; na rodovia, caminhões que passam tocam suas buzinas estridentes a saudar os corredores; na linha férrea, a surpresa de uma maria-fumaça e seu apito também a nos saudar. Enfim, impossível ignorar as sensações que a manhã nos reserva e que nos ajudará a driblar o cansaço e o tempo até nossa chegada em Piterqualquercoisa no final da tarde.


A minha frente vejo uma corredora estrangeira chamada Magda e aviso minha amiga que ela tem uma xará na prova. De imediato a nossa Magda aperta o passo e puxa conversa: “Hi Magda...”. Não demora muito e outra Magda surge (“que nome mais comum!”, penso eu) e mais uma vez Magda faz o que menos gosta, conversar, “Hi Magda...”. Pergunto a mim mesmo se será assim até o final da prova, mas o encontro internacional das Magdas ficou por aí. Detalhe que ela encontrou todas as Magdas que concluíram a prova! E sou testemunha que a nossa Magda ficou em primeiro lugar entre suas xarás, o que não deixa de ser uma espécie de pódio.


Faço uma aposta com a Magda tupiniquim: se ela encontrasse um Josué pelo caminho iria carregá-la nas costas até a chegada; desnecessário dizer que ela cruzou a linha correndo.


A cada 10 km faço contas sobre nossa velocidade média, quanto tempo falta para terminar, qual a velocidade que precisamos imprimir. Fico cada vez mais tranquilo que terminaremos sem susto. Mas não falo nada ainda à Magda, pois depois de tantos quilômetros correndo juntos já a conheço e sei que ainda é cedo e ela pode ficar ansiosa.


Chegamos ao Wall of Honour. Magda faz uma parada rápida e deposita mais um pouco das cinzas de seu pai. Seu Herval agora está ao lado de corredores que fizeram história na Comrades. Certamente que lá no céu também tem uma edição especial da Comrades e que ele vai estrear com êxito (só espero que tenha o devido respeito e não dê “pedala” em Seu Joaquim e Dona Isabel, que já são mais do que Green Number lá em cima).


Antes, rosas foram distribuídas, pego uma para mim e outra para a Magda. Passamos agora pelo Arthur’s Seat e as depositamos, pedindo licença e benção ao lendário corredor para continuar. Com certeza agora iremos chegar.


Passamos da metade da prova com cinco horas e vinte e três minutos. Digo à Magda que estamos bem, que chegaremos no tempo mesmo que nosso ritmo caia. Chegamos à Inchanga, a ladeira é forte e depois de uma maratona, andar é inevitável. Mar de gente à nossa frente e atrás de nós, impossível não sentir a energia que nos cerca.


Reparamos nos corredores a nossa volta. Pessoas comuns, sofrimento estampado no rosto, mas com uma forte determinação. Penso que qualquer corredor pode fazer esta prova, desde que queira e que treine. É uma prova difícil, com certeza, mas possível e que vale a pena.


Notamos também os números de peito (e costas) dos corredores, com diferentes cores a indicar se são estrangeiros ou sul-africanos, se buscam a medalha back-to-back, se estão na nona vez e aspiram ao cobiçado green number ou se já são veteranos com dez ou mais corridas (alguns com impressionantes vinte, trinta ou mais provas no currículo!). Percebo que coloquei no peito, em vez de nas costas, o número que indica que já corri duas Comrades e penso que terei que voltar no ano que vem só para corrigir esta falha.


Passamos por diferentes grupos étnicos e sociais. A elegância dos rapazes da escola secundária, a dor que nos causa as crianças doentes do hospital que neste dia ficam à beira da estrada vendo os corredores, as lindas meninas louras batendo palmas e marcando nosso ritmo por alguns metros, a energia do canto e das danças africanas, o canto-oração dos indianos, o cheiro do churrasco à beira da estrada (acho que fazem só para nos maltratar), os espectadores a gritar Brasil o tempo todo.


Gritam tanto “Go Brasil!” que no final você nem entende mais. Comento com Magda que quando chegar ao hotel a primeira coisa que farei será entrar no Google e pesquisar o que é este tal de “Brasil”.


Ao contrário dos outros anos, o calor é forte. A água que jogamos no corpo já bate quente, parece evaporar antes mesmo de tocar o solo. Ainda bem que os pontos de apoio são muito próximos, o que nos permite ainda beber água e energade, mas nem conseguimos beber Pepsi, de tão quente que encontramos.


Também venta muito. Magda, “a exageragda”, diz que é um tornado. Até mesmo ladeira abaixo o vento nos atrapalha, parece nos empurrar para trás. Nem adianta sermos Filhos do Vento, pois “papai” parece irritado conosco.


O forte calor e o tornado magdiano, inesperados, são até motivos de piada de um corredor a dizer que pediria reembolso na chegada porque isto não estava incluso no pacote da prova.


Em outro momento, uma corredora jovem, vinte e poucos anos talvez, encontra a família à beira da estrada, o que desencadeia uma sucessão de abraços, beijos, carinhos e recomendações. Diante daquela doce cena familiar, Magda irrompe em prantos, a ponto de eu temer que seja retirada da prova por um carro de apoio que passava por perto.


Mas nossa tranquilidade é tamanha que podemos simplesmente caminhar nas subidas e planos e ensaiar uma corridinha leve quando ladeira abaixo. Tio Ricardo pode ficar orgulhoso da corrida técnica e regular que fizemos do princípio ao fim.


Chegamos ao ponto mais alto da prova, a 870 metros de altitude, em Umlaas Road, e faltam 19 km para o final. Finalmente Magda joga ao vento o que ainda tem das cinzas de seu Pai. Comentamos que o vento é tão forte que seu Herval será espalhado por toda a África, desde a Cidade do Cabo até a foz do Rio Nilo.


Magda dispara na minha frente, de propósito deixo-a um pouco só, pois aquele momento é todo dela. Depois ela me diz que simplesmente ficou energizada e quis correr mais forte, só isto!


Chegamos bem dispostos à temível Polly Shortts, que dizem ser a última ladeira da prova, o que é uma grande mentira, pois diversas outras nos serão apresentadas ainda, até porque depois de tantas horas a correr, qualquer quebra-molas pode parecer um Himalaia. Nesse ponto, todos andam, até mesmo corredores bem preparados, à exceção de um gaiato que passa por nós simulando correr e gritando “sweet race, sweet race!”.


Somente no ponto mais alto desta ladeira é que tentamos correr novamente, apenas para fazer boa figura no vídeo da prova. A partir deste ponto restam oito quilômetros para o fim da prova e falo para a Magda: “Sabe aquele último treininho ridículo que o Ricardo nos passou? É o que falta para nós!”.


Brinco com ela e digo que a cada hora o “Instituto Nettofolha” irá atualizar as estatísticas. Algo do tipo, “faltam 10 km, daqui para frente podemos caminhar num ritmo de 4.5 km/h que chegaremos”.


Chegamos às 11 horas de prova e digo “se você tiver alguma promessa a pagar, pode ir de joelhos até o fim que dá tempo”.


Enfim, Pietermaritzburg. A chegada dentro de um estádio é sempre emocionante. Parece que você está sozinho, que todo o público aplaude e incentiva unicamente a você. É um momento todo seu. Nunca fui noiva, mas acho que uma mulher deve sentir algo semelhante, mas sem feder a suor, quando entra na igreja para casar.


Após cruzar a linha de chegada, uma medalha para mim, duas para a Magda, inclusive a back-to-back.


Acho que não sou uma boa companhia para estes momentos, pois tenho dificuldade em ter, compartilhar ou entender emoções. Mas acho que para Magda foi um momento especial, por tudo o que ela passou até atingir aquela marca. Melhor seria, com certeza, se nesse momento ela estivesse com uma pessoa mais festiva e alegre para dar vazão a tudo que sentia.


Será que Terminou?


Medalhas no peito, felizes e inteiros. Acho que seis meses de treino e dedicação tiveram êxito. Hora de encontrar os camaradas na área internacional, ouvir as histórias alegres de quem chegou, compartilhar a tristeza de quem não conseguiu desta vez. Olhar quem chegou depois, os ônibus com suas multidões, o desespero de quem entra no estádio em cima do laço, a cruel contagem regressiva, o frio e exato tiro às 17h30min que encerra a prova, o semblante intraduzível de quem chega, mas não leva a medalha.


A esses últimos uma especial admiração, por não terem desistido, de acreditarem até o final; poderiam simplesmente sentar no meio-fio e esperar um carro de resgate, mas foram até o fim; são vencedores também e provavelmente no próximo ano estarão lá novamente para, mesmo sem conhecerem, praticarem a linda canção "Tente outra vez", de Raul Seixas (receita de Marcio Villar):


Não diga que a canção está perdida

Tenha fé em Deus,
Tenha fé na vida 
Tente outra vez 

Beba (Beba) Pois a água viva ainda tá na fonte 

Você tem dois pés para cruzar a ponte
Nada acabou, não, não, não

Tente

Levante a sua mão sedenta e recomece a andar
Não pense que a cabeça aguenta se você parar 
Não, não, não, não, não, não

Há uma voz que canta, há uma voz que dança

Há uma voz que gira 
Bailando no ar

Queira (Queira)

Basta ser sincero e desejar profundo
Você será capaz de sacudir o mundo
Vai, tente outra vez

Tente (Tente)

E não diga que a vitória está perdida
Se é de batalhas que se vive a vida
Tente outra vez



A volta para Durban no ônibus da organização poderia ser mais bem organizada, mas chegamos ao hotel. Depois do banho fomos jantar e o restaurante já estava fechado. Doutora Magda, agora travestida de Nutricionista, recomenda uma refeição saudável: sanduíche com batata-frita, bastante gordura. Pior, ou melhor, que deu certo, e me senti totalmente recuperado. Basta saber se Doutora Júlia irá aprovar.


Comentário comum a todos os corredores experientes que encontrávamos: foi a Comrades mais difícil que já correram, devido ao forte calor e ao vento. Orgulho maior por termos conseguido!

Almoço do dia seguinte também inesquecível. Começou às 14 e terminou às 21 horas, confundindo-se com o jantar. Presença novamente dos camaradas da Speed e Chão do Aterro. Quarenta e uma canecas de chope (21 litros) consumidas (só eu, abstêmio que sou, tomei dois litros). Os mais variados assuntos conversados, lendas urbanas inventadas, razões para rir de tudo e de todos.

No dia seguinte, a volta para casa. No aeroporto de Durban alguém pergunta à Magda: “volta ano que vem?”; ela responde: “não sei...”. Grande mudança para quem até o dia anterior teria respondido “nunca!”'.


Josue Netto

segunda-feira, 8 de julho de 2013

O lado perverso de um capitão de equipe!!!


No dia 17 de agosto de 2013, sábado, a Ultra Runner Eventos, apoiada pela Secretaria de Esportes e Lazer da Prefeitura de Valinhos/SP, realizará a 2ª Day Night Run - 12 horas.



A prova será corrida em pista de terra de 1.35 Km, em volta da lagoa que fica no interior do Centro de Lazer do Trabalhador - Parque Ayrton Senna da Silva.



A largada para as modalidades solo (masculino e feminino); duplas e quartetos será às 10 horas da manhã, com previsão de término às 10 horas da noite.

Particularmente, adoro provas em equipe porque no contexto geral, você acaba superando os teus próprios limites quando busca ajudar a sua equipe ao máximo. Nesse propósito você acaba indo além do que imagina.

Vou usar como exemplo a prova do ano passado, quando o quarteto da Equipe Bsb Parque percorreu 164,7 Kms durante as 12 horas de prova, sob um pace de 4:22/Km. Leia a resenha da prova de 2012:

Na ocasião a equipe esteve formada pelo Capitão Samuel Toledo (1), pelo veloz Ornaldo Fernandes (2), pelo perseverante Sebastião Barba (3) e pelo quelônio do cerrado que assina esta postagem (4).

Em 2013, logo no primeiro e-mail postado pelo Capitão, me deparei com uma mensagem subliminar, inserida no trecho que abaixo transcrevo:
"Para este ano a meta é melhorar o pace no mínimo em 3 segundos cada corredor, estamos mais experientes, mais treinados, mais fortes, mais unidos e com conhecimento da prova, vai ser moleza baixar 3 segundos, faremos uma estratégia campeã."
Em breves palavras, qual seria a mensagem subliminar: - se não melhorar o pace em 3 segundos vai ficar de fora nas próximas convocações. Percebi de imediato que a tarefa não seria molezinha como o capitão afirmou!!!.

Aqui nasce o lado perverso de um capitão de equipe, por diversos meios tentei fazê-lo abandonar a novíssima estratégia, ou até mesmo, dar um refresco para os mais idosos, uma vez que estou próximo de completar meio século de vida!!! e aquilo que ocorreu no ano passado foi uma grata surpresa. Só isso e nada mais!!!

Conversas e mais conversas, não consegui demovê-lo da estratégia campeã. 

Sabe qual será o resultado prático disto pessoal? - em todos os momentos que eu for para a pista terei que fazer 4:30/Km.

Não querendo dar trégua ao azar fui buscar uma pista com as mesmas características de Valinhos e acabei arrumando um local próximo à minha residência aqui na cidade de Guaíra, Paraná, com os mesmos 1.35 Km, no Parque Marinas, um local bem arborizado e que fica às margens do majestoso  Rio Paraná.

Parque Marinas - Guaíra/PR
No último domingo, 07.07.2013,  fui lá para conferir a parte fisiológica e lancei-me a correr no ritmo do ano passado. 

Aqueles 4 tiros de 1.35 Km me fizeram ficar com gosto de sangue na boca, sem mencionar que o Garmin quase pifou de tanto apitar alucinadamente para avisar que eu estava acima da frequência cardíaca de segurança.

Dois são os propósitos desta postagem, sendo eles: 1) fomentar debate sobre as ações de um capitão de equipe; 2) se a memória não falhar... parece que o intuito do amigo (da onça, penso eu!) é quebrar a concorrência... só pode!!!

Com a palavra os amigos... deixem seu recado, comentário, avaliação.